quarta-feira, 25 de abril de 2012

Um bonde chamado desejo

        Continuando com o meu projeto de satisfazer antigas  curiosidades tomei um bonde famoso.

        Basta respirar  e ser humano  para saber o que é um desejo. Desejar é nosso céu e nosso inferno. Quem não conhece o poder de um desejo? A bíblia, o alcorão e todas as escrituras  religiosas  quase que não  abordam outro assunto: O desejo, seus perigos e armadilhas. E também oferecem  mil receitas  de como lidar com o desejo, domar o desejo ou acabar com o desejo. A sociedade de consumo ao contrário,  estimula nossos  desejos  latentes  e cria milhares de novos desejos.

                                       Já o drama de Tenesse Williams não perde tempo com repressões inócuas  ou estímulos de consumo. Nos leva  para ver o desejo  atuando  naquele  cortiço como um ser vivo,  invisível mas presente, movimentando-se  por entre o mobiliário escasso. Blanche  Dubois com sua mala de desejos  e expectativas frustradas toma o bonde que vai deixá-la  em casa de sua  irmã Stella Kowalski,  onde  conhece o cunhado Stanley Kowalski que é a encarnação  do desejo, tanto do ponto de vista de desejar quanto de ser desejado. A partir daí  a ciranda dos desejos  começa a girar.

                                      O desejo é visceral no ser humano. A despeito  de que possamos  ser uns mais egoístas  que outros,  mais grosseiros  ou requintados, todos  nos igualamos  na nossa natureza de seres desejantes. Desejos são nossas grandes motivações na hora de escolhermos  nossos  bondes. Questão arrepiante:  O que nos espera  em cada estação?

                                      O tema suscita  situações facilmente  encontráveis na vida, posto que o desejo  é uma espécie  de mola  mestra que faz com que tudo aconteça. Mas o texto cria uma confluência que  é o resultado de muita engenhosidade e sutileza. O requinte desamparado de Blanche em contraste com a grosseria de Stanley, o cortiço como um espaço físico  sempre  tão fértil  para  a promiscuidade, a dosagem  da ação que se intensifica, as músicas melancólicas,  as casas  desbotadas, a ironia do nome " belle reve"
 para uma fazenda  decadente,  a  tensão e o conflito  entre  Stanley e Blanche  pois o relacionamento  deles mistura  hostilidade e atração.

                                      O álcool, as cartas e as roupas íntimas  são bons  componentes para  intensificar a promiscuidade  e deixar o ambiente  mais  tenso e alarmante. Mas como símbolo, nada se compara  ao trem. Ele soa como um aviso. Um gélido aviso dos embates do destino.    O trem fatalmente está vindo de algum lugar e chegará noutro. O que nos aguarda aí? E o que acontecerá na viagem? Quais são  nossos companheiros?  Onde nos levará o trem da vida? Perguntas sinistramente significativas  para Blanche  que de veículo em veículo é carregada  pelo destino ( ou pelas circunstâncias)  como uma pena pelo vento.

                                      A meu ver  é uma  grande peça teatral com  uma ação extremamente envolvente. Uma  montagem bem feita terá tudo  para conseguir uma comunicação  profunda  com a platéia e oferecer  um daqueles  espetáculos  de onde saímos apaziguados com  a  vida. 

Um bonde chamado desejo
Tenessee Williams                                         

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